INVESTIGADORES
SKLIAR Carlos Bernardo
libros
Título:
Experiencias com a palavra: notas sobre linguagem e diferença
Autor/es:
CARLOS SKLIAR
Editorial:
Wak Editora
Referencias:
Lugar: Rio de Janeiro; Año: 2012 p. 184
ISSN:
978-85-7854-188-0
Resumen:
Ler é entender. E ler bem é entender mal-entendendo. A história das leituras de qualquer texto é a história de seus bons mal-entendidos. Temos de aprender, então, a arte de mal-entender bem, isto é, a arte de mal-entender criativamente, com imaginação, brincando com o sentido, deslocando ou pervertendo o sentido, assumindo riscos. Mas existem livros que, além de tentarmos entendê-los ou mal-entendê-los, merecem ser escutados. Existem livros que supõem modos de receptividade que ultrapassam a compreensão, porque vão muito além do entender ou do mal-entender. Existem livros que pedem que concentremos a atenção, que afinemos o ouvido. Experiências com a palavra é um desses livros, que nos fazem atender não só ao que têm de inteligível, ou de ininteligível, mas também, sobretudo, ao que têm de sensível: ao seu tom, ao seu ritmo, a suas modulações, à qualidade de seus silêncios. Um desses livros que estão escritos com uma língua carnal e estremecida, trêmula. Um desses livros em que as palavras são corpo e se fazem corpo. Um desses livros em que a escritura não experiencias com a palavra. Renuncia à voz, porque é voz e porque se faz voz. Um desses livros que colocam nosso ouvido à prova, nosso ouvido vibrante e ressonante, trêmulo. A língua é corpo, o ouvido é corpo, a voz é corpo. A subjetividade é corpo vivo, sensível, exposto à carícia e à ferida, mortal. A voz é a marca da subjetividade na linguagem. Ou a marca da linguagem na subjetividade. Por isso, a voz não só tem a ver com a boca ou com a orelha mas também com todo o sujeito. Na voz, é o próprio sujeito que está em jogo. Não o indivíduo, mas o sujeito. Pessoal e impessoal ao mesmo tempo. Singular e plural ao mesmo tempo. Neste livro, a voz é uma língua, que transforma um sujeito ou um sujeito que transforma uma língua, convertendo-se ambos, o sujeito e a língua, em uma singularidade qualquer, ao mesmo tempo presente e ausente, que assina Carlos Skliar. Em suas Experiências com a palavra, Carlos as toca com a ponta da língua para explorar sua textura, seu sabor, sua densidade. E as faz soar para dentro do ouvido, para captar suas ressonâncias, seus ecos, suas vacuidades. Mas também as pensa e as faz pensar. Para pensar nelas, para fazer-nos pensar com elas, para experimentar o que as palavras têm de pensamento. Não de ideias, mas de pensamento. A voz, neste livro, é uma voz que diz pensando. Talvez não saiba o que diz, mas o pensa. E nos dá a pensar. Escrever, aqui, e pensar não é ordenar as ideias ou dispor as palavras, senão, debruçar-se sobre um poço, tatear as beiradas de um abismo. Tocar temerosa e temerariamente o abismo da linguagem e o abismo do pensamento. E esperar que algo, talvez uma voz que pensa ou um pensamento que fala, responda lá do fundo, desde a escuridão. E escrevê-lo. E pensá-lo. E escrevê-lo. As palavras de Carlos, ou as palavras que falam a Carlos e, por meio de Carlos, a nós, a seus leitores e a seus ouvintes, tocam o amor, o tempo, a morte. Tocam a vida, que é irrupção do outro, e tocam o outro que é irrupção de vida. Deixam-se tocar pelo amor, pelo tempo, pela morte, pelo outro, pela vida. Por isso, são uma poética, que é, ao mesmo tempo, uma forma de vida: uma poética da existência. Estranho, esse ofício de experimentar palavras. Ler e escrever. Aprender a ler e a escrever, cada vez que se lê ou que se escreve. Falar e escutar. Perguntar-se o que é falar, cada vez que se fala e o que é escutar, cada vez que se escuta. E pensá-lo. E escrevê-lo. Estranha paixão, a de experimentar as palavras pensativamente, estranha forma de vida. Buscar uma voz na linguagem e uma língua para a voz. Tratar de construir textos que não sejam completamente afônicos e tratar de construir-se neles. Colocar o corpo na linguagem e a linguagem no corpo. Deixar-se conduzir por um ritmo, deter-se em um silêncio, deslizar-se na oscilação dos tons, modular-se em uma melodia. Tentar uma e outra vez que as palavras pensem e façam pensar. Fazer com que as palavras toquem, de algum modo, a vida, que se façam vida, e fazer com que a vida toque, de algum modo, as palavras, que se façam palavras. Estranho, esse tremor ao experimentar sensivelmente as palavras. Esperar que talvez, algum dia, um pensamento, vindo de não se sabe onde, se deixe surpreender em uma frase, vinda de não se sabe o quê. Ou ao contrário. E vivê-lo. E escrevê-lo. Estranha forma de amor, de amizade. Experiências com a palavra.