INVESTIGADORES
SKLIAR Carlos Bernardo
capítulos de libros
Título:
Conversar e conviver com os desconhecidos
Autor/es:
CARLOS SKLIAR
Libro:
Politicas publicas, movimientos sociais.
Editorial:
ANPED SUDESTE 2011
Referencias:
Lugar: Rio de Janeiro ; Año: 2011; p. 27 - 37
Resumen:
Conversar: palavra hospedada em outras palavras, como amorosidade,
amizade, hospitalidade. Pode, em sua pronúncia, assumir a forma
do acariciar, deslizar, acompanhar, capacitar, ajudar, educar. Mas também
desolar, exilar, confundir, alterar, incidir. Às vezes, produz um imediato cansaço. Por si mesma se desprende, se desorienta e obriga um sujeito a estar com outro sujeito em meio a um código formal, para que ambos confirmem que não se sabe o que dizer ou que não há nada para se
dizer. Começa com outro, não se sabe quando. Nem onde. Nem quem é o outro. Termina no interior de si mesmo, não se sabe por quê. Nem o que fazer. É um convite, não para explicar nem para compreender, mas para transcorrer e devir eternamente em sua escarpada geografia. Como o errar e como o amar, conversar é humano.
Quase não se conversa com outros, quase não se conversa de outras
coisas; no melhor dos casos apenas se conversa sempre entre os mesmos e
sempre das mesmas coisas. A linguagem tem se tornado um refúgio opaco
de narrativas sombrias em que cada um repete para si e se vangloria
indefinidamente de suas poucas palavras, de sua pouca expressividade e de
sua incapacidade manifesta para a escuta da linguagem dos demais. Quase
ninguém reconhece vozes cuja origem não sejam as suas próprias, quase
ninguém escuta senão o eco de suas próprias palavras, quase ninguém encarna a pegada que deixam outras palavras, outros sons, outros gestos, outros rostos.Essa dificuldade ou impossibilidade de conversação em educação tem a ver, em parte, com o esvaziamento da linguagem da disciplina pedagógica. Há uma clara sensação de vazio e a percepção, estranha, intensa, indecifrável, corpórea, de que tudo se tornou impronunciável. Vale a pena citar(aqui) Jorge Larrosa: Quando digo que essa linguagem parece vazia, me refiro à sensação de que se limita a gerir adequadamente o que já se sabe, o que já se pensa, o que, de alguma forma, se pensa sozinho, sem ninguém que o pense, quase automaticamente (
). Quando digo que essa linguagem está se tornando impronunciável me refiro, por exemplo, ao seu caráter totalitário, ao modo como converte em obrigatórias tanto uma certa forma da realidade (
) como uma certa forma da ação humana (Larrosa, 2005, p. 31). O vazio e o impronunciável referem-se, quase no limite do desespero, a uma filiação esquiva entre o que dizer, quem o diz e como se dissemina o dito. Deveríamos prestar uma atenção mais escrupulosa às máscaras institucionais com que se pretende regular, administrar e, desse modo, destruir a conversa, pois se percebe o grande incômodo em relação aos simulacros de conversa que ocorrem, diariamente, no interior dessa linguagem pretensamente acadêmica.